As imagens pouco puritanas da Idade Média

Desenho da época da Idade Média: Uma criatura demoníaca atira uma flecha nas nádegas de um tritão.

A Idade Média é sinônimo de religião, mas a vida nos monastérios podia ser monótona. Como solução, os monges desenhavam nas margens dos livros.

ATUALIZADO EM 17/10/2013
Desenho da época da Idade Média: Uma criatura demoníaca atira uma flecha nas nádegas de um tritão.

Desenho da época da Idade Média: Uma criatura demoníaca atira uma flecha nas nádegas de um tritão.

Quando se pensa na Idade Média, a expressão que muitas vezes vem à mente é “Idade das Trevas”. É fato que naquele período houve a ampliação e predominância da vida religiosa, regrada a Deus e da proliferação dos monastérios. Contudo, para os monges, essa vida estritamente dentro dos monastérios e conventos poderia chegar a ser “monótona”. A válvula de escape adotada por aqueles que estavam incumbidos de fazer dezenas de cópias de manuscritos era, aos olhos de hoje, um tanto quanto divertida e aparentemente contraditória em relação ao estilo de vida que nos remete a expressão “Idade das Trevas”.

As imagens impuras da Idade Média

Em meio aos inúmeros manuscritos, os monges extravasavam, para além da continuidade da vida religiosa, desenhando nas margens dos livros. Através de figuras engraçadas e muitas vezes profanas de pessoas sendo molestadas por figuras demoníacas, ou desenhos de fezes e frases como “Now I’ve written the whole thing: for Christ’s sake give me a drink.” (Agora que eu escrevi tudo, pelo amor de Deus, me dá uma bebida), a rotina regrada a Deus parecia sofrer uma quebra.

Ao mesmo tempo em que tais imagens engraçadas e curiosas eram frutos da livre criatividade e descontração, essas práticas também contam um pouco sobre a vida naquela época. A dicotomia “religião versus vida pagã” não deve ser tomada como regra, vez que os desenhos profanos não significavam um abalo à santidade e ao sagrado dos manuscritos. A ideia por trás de tais imagens estava justamente atrelada à continuidade do sagrado e não uma afronta. Portanto, esses rabiscos poderiam ser traduzidos como um alerta: “A vida é cheia de tentações, mas deve-se resistir a elas”.

Foto: (desenho) ‘The Maastricht Hours’, Liège século XIV. BL, Stowe 17, fol. 176r

Foto: (desenho) ‘The Maastricht Hours’, Liège século XIV. BL, Stowe 17, fol. 176r

Bibliothèque Nationale de France, Français 25526. Roman de la Rose, França, século XIV.

Bibliothèque Nationale de France, Français 25526. Roman de la Rose, França, século XIV.

Referências:
MICHAEL CAMILLE, Image on the Edge: The Margins of Medieval Art,. Cambridge, Mass. Harvard University Press, 1992.