
Foto: Sven Rosborn. Museu de Foteviken. Galeria de Sven Rosborn a respeito da pré-história da Dinamarca.
Extremamente bem preservada, trazendo ainda linhas de expressão e até resquícios de barbas, a múmia de Tollund é simplesmente incrível pelo grau de conservação, além de trazer mais uma vez para o debate e conhecimento uma das facetas humana mais curiosas: os rituais de sacrifício. O homem que ficou conhecido como “homem de Tollund” viveu na Escandinávia durante a Idade do Ferro e foi sacrificado há 2 mil anos.
Enterrado em um pântano na Dinamarca, a múmia foi encontrada apenas em 1950 e, devido às condições do local encontrado, onde há baixa oxigenação e muitos musgos, o corpo foi mumificado, ficando extremamente bem preservado; o que levou seus descobridores a suspeitar de uma vítima recente de assassinato.
Depois de alguns exames do professor de arqueologia, P. V. Glob, foi alegado que o corpo tinha mais de dois mil anos de idade e possivelmente fora utilizado como oferenda em um ritual de sacrifício, já que trazia consigo uma corda apertada — feita com peles de animais — ao redor do pescoço.
No meio acadêmico não há um consenso com relação a como os vikings e pré-vikings se relacionavam e lidavam com suas religiões e crenças mitológicas. Alguns escritos entre os séculos X e XIV descrevem algumas dessas interações entre religião e sociedade. De acordo com o clérigo alemão Adam de Bremen, no século XI, todos os deuses nórdicos e pagãos tinham seus próprios sacerdotes e a população oferecia sacrifício buscando obter determinados benefícios.
Rituais destinados ao deus Tor tinham relação com períodos de escassez, aqueles feitos para o deus Odin buscavam a vitória em alguma batalha e para Freyr buscavam a fecundidade. Ainda assim, não se sabe exatamente o motivo pelo qual, entre tais sacrifícios, estava a prática de jogar pessoas em pântanos, lagos e rios. A única certeza que se tem é que essas pessoas eram oferendas aos deuses e a prática provavelmente se iniciou entre o século V e o século I a.C.. O homem de Tollund seria um exemplar e resultado das práticas ritualísticas em nome de deuses.
Em 2002, novos estudos foram realizados e, observando que a língua da múmia estava inchada, bem como as vértebras cervicais muito danificadas, foi reforçada a tese de sacrifício, pois esses eram sinais que corroboravam com a suposição de enforcamento. Outro indício que também corroborou com tal hipótese, ao invés da execução — como castigo para um crime —, foi a descoberta de diferentes tipos de sementes no estômago do homem de Tollund.
Como não era algo comum a população ter uma alimentação diversificada àquela época, os cientistas concluíram que a última refeição do homem era um sinal dele estar participando de alguma ocasião especial, por exemplo, um ritual. A oferta de sacrifício para os deuses e as refeições subsequentes que todos participavam, poderiam representar tanto um reconhecimento do poder divino, bem como uma tentativa de alinhar a vida com a vontade divina.
Era um ato realizado na esperança de que os deuses respondessem favoravelmente a um pedido e se o tal ato não fosse bem sucedido, poderia haver grandes problemas para os povos adoradores. Alguns desses sacrifícios eram realizados através do enforcamento, posteriormente atirando-se o corpo a um pântano. As oferendas humanas normalmente eram de prisioneiros de guerras e batalhas, empregados ou criminosos.
Em tempos de crise, os membros das famílias mais nobres poderiam ser sacrificados para apaziguar Odin. Dessa forma, o Homem de Tollund é um achado arqueológico incrível por ser um dos exemplos mais bem preservados já encontrado na História e oriundo de rituais realizados pelos povos nórdicos para seus deuses, algo pouco documentado e que suscita muitas dúvidas nos pesquisadores atuais.