A partir de 1944, nos momentos finais da Segunda Guerra Mundial (1939 – 1945), durante a campanha do Pacífico, diversos navios de guerra aliados passaram a sofrer ataques suicidas deflagrados por militares pertencentes às forças armadas imperais japonesas. Esta desesperada tática, fruto das sucessivas derrotas militares japonesas neste período do conflito, foi desencadeada por militares conhecidos como kamikazes, ou “vento divino”.
Os kamikazes faziam parte de um esquadrão especial de ataque, sendo designados para cumprir a missão de jogar contra os navios inimigos os próprios aviões repletos de explosivos. Oriundo de uma peculiar ética militar, que mesclava às táticas modernas a concepções distorcidas dos antigos códigos de conduta dos samurais, este tipo de missão era considerada como espécie de honra suprema por parte daqueles que eram designados a tal tarefa.
Não se sabe ao certo quantos ataques deste tipo vieram a ser desencadeados, ainda que os números sejam impressionantes: cerca de 47 embarcações teriam sido afundadas, bem como outras 300 avariadas. Nessas investidas, cerca de 4 mil japoneses kamikazes morreram. O sucesso desse tipo de ataque costumava ser maior do que os combates convencionais, dadas as maiores proporções dos impactos e resultados de seu uso. O pico do uso deste tipo de ataque veio a ocorrer na Batalha de Okinawa, em 1945.
Apesar das baixas, os Aliados não vieram a sofrer perdas consideráveis ao ponto de refrear sua ofensiva nesta fase do conflito. O Império Japonês, ao contrário, viu serem sacrificados milhares de seus soldados em sua defesa por meio destes ataques: o antigo lema samurai “lealdade e honra até a morte” era interpretado de maneira quase literal pelos kamikazes como meio de recusa de render-se diante do inimigo.
Abaixo estão transcritas as últimas cartas de alguns militares kamikazes:
Tenho o prazer de ter sido escolhido como um membro da Força de Ataque Especial, mas não posso deixar de chorar quando penso em você, mãe. Quando reflito sobre as esperanças que você tinha para o meu futuro… Eu me sinto tão triste que eu vou morrer sem fazer nada para lhe trazer alegria” – Ichizo Hayashi, última carta para casa poucos dias antes de seu voo final. Abril 1945.
Caro Masanori e Kiyoko,
Mesmo que não possam me ver, eu vou sempre estar observando vocês. Obedeçam a sua mãe, e não a perturbem. Quando vocês crescerem, sigam o caminho que vocês gostariam e cresçam para serem boas pessoas. Não invejem o pai de outros, pois eu me tornarei um espírito e observarei de perto vocês dois. Ambos, estudem muito e ajudem sua mãe com o trabalho. Eu não posso ser o cavalinho para montar, mas vocês dois serão bons amigos. Do Pai.” – Carta do Capitão Masanobu Kuno aos filhos de 5 e 2 anos, enviada na véspera do ataque.
Motoko,
Muitas vezes você olhou e sorriu para o meu rosto. Você também dormiu em meus braços, e tomamos banho juntos. Quando você crescer e quiser saber sobre mim, pergunte a sua mãe e tia Kayo. Meu álbum de fotos foi deixado para você em casa. Dei-lhe o nome de Motoko, esperando que você fosse uma pessoa gentil, bondosa e carinhosa.
Eu quero ter a certeza de que você estará feliz quando crescer e se tornará uma noiva esplêndida, e mesmo que eu morra sem você me conhecer, você nunca deve se sentir triste. Quando você crescer e quiser me encontrar, por favor, venha ao Kudan [Templo de adoração àqueles que se foram]. E se você orar profundamente, com certeza o rosto de seu pai vai mostrar-se dentro do seu coração. Eu acredito que você vá ser feliz. Desde o seu nascimento você mostra grande semelhança a mim, e outras pessoas costumam dizer que quando eles te viram, sentiram como se estivessem me vendo. Seu tio e minha tia vão cuidar bem de você que é a minha única esperança de sua mãe sobreviver. Mesmo que alguma coisa me aconteça, você certamente não deve pensar em si mesma como uma filha sem pai. Estou sempre te protegendo. Por favor, seja uma pessoa boa com as outras. Quando você crescer e começar a pensar em mim, por favor, leia esta carta. Do pai.
PS: No meu avião, eu continuo carregando como um amuleto a boneca que você ganhou quando nasceu. Então isso significa, Motoko, que está junto do pai. Digo isso porque eu estar aqui sem o seu conhecimento faz meu coração doer.” – Considerada uma das cartas mais bonitas, foi escrita pelo Tenente Sanehisa Uemura de 25 anos à filha Motoko.
Entrei para o Corpo Shinbu Esquadrão de Ataque e vou pagar minha dívida de gratidão para com o país.
Pai e Mãe, eu me propus à batalha em alto astral. Pai e Mãe, eu coloquei uma foto do meu irmão mais velho no meu macacão de vôo. Pai e Mãe, estou profundamente envergonhado de mim mesmo que, até o final, não corrigi o meu discurso impróprio e rude de uma criança.
Mãe, você me criou desde que eu tinha seis anos de idade, e eu nunca disse “mãe” para você que é mais do que minha mãe biológica. Como deve ter sido triste para você. Eu pensei muitas vezes em chamá-la, mas eu não fiz diante de você, pois tinha vergonha.
Agora é a hora para eu chamá-la em voz alta: “Mãe”.
Provavelmente o meu irmão mais velho, no centro da China, também sente o mesmo. Mãe, por favor, perdoe nós dois. Agora, como estou saindo para a batalha para fazer um ataque especial, a minha única preocupação são as duas coisas mencionadas acima. Para além destas, eu não tenho arrependimentos.
As pessoas vivem 50 anos e eu viverei uma vida longa de 20 anos de idade. Quanto aos 30 anos restantes, dei a metade a cada um de vocês, pai e mãe. Por favor, usem o dinheiro guardado na caixa de cigarros.
Pai e Mãe, eu estou indo. Eu estou indo com um sorriso e a certeza de destruir um navio inimigo.” – Carta do Cabo Nobuo Aihana, com 18 anos. Aki, sua madrasta, recebeu a carta depois do fim da guerra e a manteve como o seu bem mais precioso até o dia de sua morte, em 1975, quando faleceu aos 77 anos.