Com a quebra do pacto Ribbentrop-Molotov (pacto de não agressão) durante a Segunda Guerra Mundial, deu-se início à operação Barbarossa, codinome da maior campanha militar da história em termos de mobilização de tropas e baixas sofridas. Em janeiro de 1942, o fotógrafo soviético Dmitri Baltermants capturou uma imagem devastadora perto de Kerch, na Crimeia, mostrando pessoas chorando ao lado de corpos de seus entes queridos no chão.
O início das perdas pelos soviéticos
Na madrugada do dia 22 de junho de 1941, mais de três milhões de soldados alemães cruzaram a fronteira soviética. O avanço alemão em território russo foi rápido e avassalador. Em poucos dias, a Força Aérea Russa havia sido praticamente dizimada (a maioria dos aviões foram destruídos ainda em solo) e os blindados soviéticos em formação dispersa não foram páreos para a formação Blitzkrieg alemã. Em pouco tempo a Operação Barbarossa tornou-se uma questão de sobrevivência para os soviéticos.
Nenhum país, nenhum povo, lutou tanto quanto a União Soviética durante a Segunda Guerra Mundial. Em nenhum outro lugar as memórias da guerra permaneceram tão vivas e tão profundas. A invasão alemã trouxe uma tal catástrofe, que parecia, a princípio, que nenhuma nação suportaria. Tão somente no cerco a Leningrado, que durou mais de dois anos, morreram mais seres humanos do que britânicos e americanos durante toda a guerra.
Expressão poética das perdas
Durante a Segunda Guerra Mundial, poetas soviéticos usaram sua arte para expressar as imensas perdas e o profundo sofrimento do povo soviético. Poemas como “Wait for Me” de Konstantin Simonov capturaram a angústia e a esperança dos soldados e de suas famílias. Escrito em 1941, tornou-se um símbolo de resiliência e devoção, evocando a promessa de retorno de um soldado à sua amada. Além disso, Anna Akhmatova, em sua obra “Requiem“, lamentou a dor das mães e viúvas que perderam seus entes queridos, refletindo a tragédia pessoal e coletiva da guerra. Poemas como esses desempenharam um papel crucial em manter o moral e a solidariedade durante os anos de conflito.
Contudo, a poesia soviética da época não apenas documentou o sofrimento, mas também exaltou a bravura e o sacrifício dos combatentes. Aleksandr Tvardovsky, em seu poema épico “Vasily Tyorkin”, criou uma figura heroica que simbolizava o espírito indomável do soldado soviético comum. Esses poemas serviram para unir a nação em torno de um sentimento comum de perda e resistência. Além disso, a literatura poética ajudou a preservar a memória das atrocidades e do heroísmo para as gerações futuras. A poesia da Segunda Guerra Mundial continua a ser uma poderosa ferramenta de reflexão sobre os custos humanos do conflito, destacando a importância de recordar e honrar aqueles que sacrificaram tudo.
Apesar de estarem acostumados à inúmeras perdas durante toda guerra, os soviéticos não fingiam estar imunes à dor. Dezenas de milhares de pessoas conheciam o poema “Wait for Me”, de Konstantin Simonov, de cor:
Espera por mim, e regressarei,
Mas espera muito.
Espera até se encheres de pena
Enquanto vês a chuva amarela.
Espera até os ventos
Varrerem as neves.
Espera no calor sufocante.
Espera até os outros desistirem
Quando esquecerem o Ontem.
Espera mesmo que não cheguem
Cartas de longe para você.
Espera mesmo quando os outros
Estiverem cansados de esperar.
Espera mesmo quando a minha mãe
E o meu filho pensarem que morri.
E quando os amigos se sentarem
Bebendo em minha memória.
Espera, e não se apresses a beber
Em minha memória também.
Espera, pois regressarei,
Desafiando cada morte.
E deixa aqueles que não esperaram
Dizer que tive sorte.
Eles nunca compreenderão
Que, no meio da morte,
Você, e a sua espera,
Me salvaram.
Apenas você e eu saberemos
Como sobrevivi.
Foi porque você esperou por mim
Como mais ninguém o fez.”
Outro poema soviético dizia o seguinte:
Não me chames, pai.
Não me procures.
Não me chames
Nem desejes o meu regresso.
Estamos num caminho desconhecido
O fogo e o sangue apagaram a rota.
Voamos, nas asas dos relâmpagos,
Para não mais desembainhar a espada.
Todos nós tombamos em batalha,
Para não mais voltarmos.
Haverá um reencontro?
Não sei.
Sei apenas que devemos
Continuar a lutar.
Somos grãos de areia no infinito
E nunca mais veremos a luz.
Adeus, meu filho,
Adeus, minha consciência.
Minha juventude e meu consolo,
Meu único filho.
Que esta despedida seja o fim
Da vasta solidão,
Pois não há ninguém mais só.
Lá permanecerás
Para todo o sempre
Longe da luz e do ar.
A tua morte não será contada.
Não contada e não atenuada a morte,
Para não mais ressuscitar,
Para todo o sempre
Um rapaz de 18 anos.
Adeus, então.
Nenhum comboio chega dessa região
Com ou sem horário,
Nenhum avião pode aí chegar.
Adeus, meu filho,
Pois milagres não acontecem.
E, neste mundo,
Os sonhos não se realizam.
Adeus.
Sonharei contigo
Quando eras bebê,
Caminhando pela terra
Com passos fortes.
Pela terra onde já tantos
Estavam enterrados.
Esta canção, meu filho,
Chegou ao fim.”
A União Soviética foi salva pelos soldados e pelo povo. Mas na terra, sem chegarem a ver a paz, jaziam 20 milhões de mortos.