por karonte | 26/07/2014 | Genocídios, Guerras, Século XX, Segunda Guerra Mundial
Com a quebra do pacto Ribbentrop-Molotov (pacto de não agressão) durante a Segunda Guerra Mundial, deu-se início à operação Barbarossa, codinome da maior campanha militar da história em termos de mobilização de tropas e baixas sofridas. Em janeiro de 1942, o fotógrafo soviético Dmitri Baltermants capturou uma imagem devastadora perto de Kerch, na Crimeia, mostrando pessoas chorando ao lado de corpos de seus entes queridos no chão.
O início das perdas pelos soviéticos
Na madrugada do dia 22 de junho de 1941, mais de três milhões de soldados alemães cruzaram a fronteira soviética. O avanço alemão em território russo foi rápido e avassalador. Em poucos dias, a Força Aérea Russa havia sido praticamente dizimada (a maioria dos aviões foram destruídos ainda em solo) e os blindados soviéticos em formação dispersa não foram páreos para a formação Blitzkrieg alemã. Em pouco tempo a Operação Barbarossa tornou-se uma questão de sobrevivência para os soviéticos.
Nenhum país, nenhum povo, lutou tanto quanto a União Soviética durante a Segunda Guerra Mundial. Em nenhum outro lugar as memórias da guerra permaneceram tão vivas e tão profundas. A invasão alemã trouxe uma tal catástrofe, que parecia, a princípio, que nenhuma nação suportaria. Tão somente no cerco a Leningrado, que durou mais de dois anos, morreram mais seres humanos do que britânicos e americanos durante toda a guerra.
Expressão poética das perdas
Durante a Segunda Guerra Mundial, poetas soviéticos usaram sua arte para expressar as imensas perdas e o profundo sofrimento do povo soviético. Poemas como “Wait for Me” de Konstantin Simonov capturaram a angústia e a esperança dos soldados e de suas famílias. Escrito em 1941, tornou-se um símbolo de resiliência e devoção, evocando a promessa de retorno de um soldado à sua amada. Além disso, Anna Akhmatova, em sua obra “Requiem“, lamentou a dor das mães e viúvas que perderam seus entes queridos, refletindo a tragédia pessoal e coletiva da guerra. Poemas como esses desempenharam um papel crucial em manter o moral e a solidariedade durante os anos de conflito.
Contudo, a poesia soviética da época não apenas documentou o sofrimento, mas também exaltou a bravura e o sacrifício dos combatentes. Aleksandr Tvardovsky, em seu poema épico “Vasily Tyorkin”, criou uma figura heroica que simbolizava o espírito indomável do soldado soviético comum. Esses poemas serviram para unir a nação em torno de um sentimento comum de perda e resistência. Além disso, a literatura poética ajudou a preservar a memória das atrocidades e do heroísmo para as gerações futuras. A poesia da Segunda Guerra Mundial continua a ser uma poderosa ferramenta de reflexão sobre os custos humanos do conflito, destacando a importância de recordar e honrar aqueles que sacrificaram tudo.
Apesar de estarem acostumados à inúmeras perdas durante toda guerra, os soviéticos não fingiam estar imunes à dor. Dezenas de milhares de pessoas conheciam o poema “Wait for Me”, de Konstantin Simonov, de cor:
Espera por mim, e regressarei,
Mas espera muito.
Espera até se encheres de pena
Enquanto vês a chuva amarela.
Espera até os ventos
Varrerem as neves.
Espera no calor sufocante.
Espera até os outros desistirem
Quando esquecerem o Ontem.
Espera mesmo que não cheguem
Cartas de longe para você.
Espera mesmo quando os outros
Estiverem cansados de esperar.
Espera mesmo quando a minha mãe
E o meu filho pensarem que morri.
E quando os amigos se sentarem
Bebendo em minha memória.
Espera, e não se apresses a beber
Em minha memória também.
Espera, pois regressarei,
Desafiando cada morte.
E deixa aqueles que não esperaram
Dizer que tive sorte.
Eles nunca compreenderão
Que, no meio da morte,
Você, e a sua espera,
Me salvaram.
Apenas você e eu saberemos
Como sobrevivi.
Foi porque você esperou por mim
Como mais ninguém o fez.”
Outro poema soviético dizia o seguinte:
Não me chames, pai.
Não me procures.
Não me chames
Nem desejes o meu regresso.
Estamos num caminho desconhecido
O fogo e o sangue apagaram a rota.
Voamos, nas asas dos relâmpagos,
Para não mais desembainhar a espada.
Todos nós tombamos em batalha,
Para não mais voltarmos.
Haverá um reencontro?
Não sei.
Sei apenas que devemos
Continuar a lutar.
Somos grãos de areia no infinito
E nunca mais veremos a luz.
Adeus, meu filho,
Adeus, minha consciência.
Minha juventude e meu consolo,
Meu único filho.
Que esta despedida seja o fim
Da vasta solidão,
Pois não há ninguém mais só.
Lá permanecerás
Para todo o sempre
Longe da luz e do ar.
A tua morte não será contada.
Não contada e não atenuada a morte,
Para não mais ressuscitar,
Para todo o sempre
Um rapaz de 18 anos.
Adeus, então.
Nenhum comboio chega dessa região
Com ou sem horário,
Nenhum avião pode aí chegar.
Adeus, meu filho,
Pois milagres não acontecem.
E, neste mundo,
Os sonhos não se realizam.
Adeus.
Sonharei contigo
Quando eras bebê,
Caminhando pela terra
Com passos fortes.
Pela terra onde já tantos
Estavam enterrados.
Esta canção, meu filho,
Chegou ao fim.”
A União Soviética foi salva pelos soldados e pelo povo. Mas na terra, sem chegarem a ver a paz, jaziam 20 milhões de mortos.
Referências:
Baseado e adaptado do documentário World at War (O Mundo em Guerra), produzido pela BBC em 1973.
Gilbert, Martin. The Second World War: A Complete History. Holt Paperbacks, 2004.
Hosking, Geoffrey. Russia and the Russians: A History. Belknap Press, 2001.
Merridale, Catherine. Ivan’s War: Life and Death in the Red Army, 1939-1945. Metropolitan Books, 2006.
Weinberg, Gerhard L. A World at Arms: A Global History of World War II. Cambridge University Press, 1994.
Akhmatova, Anna. Requiem. Leningrad, 1963.
Simonov, Konstantin. Wait for Me and Other Poems. Foreign Languages Publishing House, 1943.
Tvardovsky, Aleksandr. Vasily Tyorkin: A Book About a Soldier. Progress Publishers, 1945.
Brooks, Jeffrey. Thank You, Comrade Stalin!: Soviet Public Culture from Revolution to Cold War. Princeton University Press, 2000.
por | 18/09/2013 | Curiosidades, Segunda Guerra Mundial
Hans-Georg Henke: o soldado menino. A tristeza nos olhos de Hans dizem muito. Ele era apenas uma criança lutando em uma guerra de adultos. Foto: John Florea/LIFE Magazine/Getty Images.
A Segunda Guerra Mundial foi uma das guerras mais cruéis pela qual o mundo passou. Não foi um conflito só entre países, envolvendo apenas as partes beligerantes na figura de seus soldados. A guerra estava em todos os âmbitos, nas cidades, dentro das casas e envolvia todos para o conflito, inclusive as crianças e os adolescentes como o garoto Hans-Georg Henke, com apenas 15 anos de idade na época.
Hans-Georg Henke
Hans-Georg Henke pode ser considerado a imagem dessa face cruel da guerra que levou inúmeras crianças e adolescentes à frente de batalha. Em todas as fotos, tiradas quando Henke foi capturado pelos soldados soviéticos, é mostrada apenas uma criança assustada e sem rumo em meio ao caos e aos bombardeios advindos das tropas inimigas. Hans caíra em lágrimas quando percebeu que seu mundo havia ruído; tudo a sua volta estava desmoronando e seu país não era mais o mesmo.
Quando entrou para a Luftwaffe, Georg tinha apenas 14 anos. Ele não se alistara porque gostava da guerra, mas pelo fato de precisar sobreviver. Seu pai morrera em 1938, sua mãe em 1944 e, posteriormente, ele se separara dos irmãos, ficando sozinho em um país em guerra. Henke entrou para o esquadrão anti-aéreo alemão para se sustentar e quando o conflito acabou, o menino de 15 anos teve que andar 60 milhas (cerca de 96 km), buscando alcançar as linhas americanas, pois tinha medo de ser capturado pelos soviéticos. Por fim, seu medo se concretizou em 3 de abril de 1945, quando foi capturado por uma tropa soviética. No momento da captura, em meio aos bombardeios contra seus companheiros de batalha, diversas fotografias foram tiradas pelo fotógrafo John Florea, transformando o semblante de Henke conhecido como um dos símbolos das dificuldades proporcionadas pela guerra.
Final do conflito
Após o fim do conflito e já capturado, os soviéticos alimentaram o menino e outros soldados que estavam com ele e depois mandaram que todos fossem para suas casas. Hans-Georg voltou para sua cidade natal em Finsterwalde, onde se reencontrou com os dois irmãos e iniciou uma nova vida. Faleceu em 6 de outubro de 1997, após ter tido uma vida plena. Apesar dos anos que passaram e deixaram para trás a realidade cruel que vitimou crianças e adolescentes na gurra, as fotos do menino de 15 anos eternizaram para sempre o semblante de uma criança em meio à Segunda Guerra Mundial.
por karonte | 12/09/2013 | Artigos, Personalidades, Século XX, Segunda Guerra Mundial
O oficial Hiroo Onoda havia sido enviado para a ilha Lubang em dezembro de 1944, onde se juntou a um grupo de soldados japoneses que tinham a missão de resistir à qualquer custo aos ataques inimigos.
O começo da insurgência Hiroo Onoda
Em 28 de fevereiro de 1945, tropas americanas atacaram e, após uma batalha de quatro dias, todos os combatentes japoneses foram mortos ou capturadas, com exceção de Onoda e outros três soldados, que correram para as montanhas. A partir daí, décadas de insurgência foram iniciadas, mesmo após a guerra. Vários avisos deixados por nativos da ilha e panfletos foram atirados de aviões militares anunciando o fim da Segunda Guerra Mundial, mas os soldados japoneses se recusaram a acreditar. Em setembro de 1949, Akatsu, um dos soldados, se entregou às autoridades filipinas e pouco tempo depois, deixou um recado para seus três compatriotas que ficaram na selva, avisando que de fato a guerra havia terminado e que ele não havia sofrido nenhuma retaliação, contudo, Onoda e seus companheiros deduziram que se tratava de uma traição de seu antigo companheiro e uma tática do inimigo para capturá-los.
Em 1954, Shimada, soldado japonês que havia partido para a guerra deixando sua jovem esposa com uma filha recém-nascida, foi morto. Em 19 de outubro de 1972, o último companheiro, Kozuka, também tombou após um ataque. Onoda estava sozinho na selva. Já em 1974, Norio Suzuki, um estudante japonês, foi até a ilha de Lubang, onde encontrou o oficial japonês e o advertiu sobre o fim da Guerra. O oficial japonês ainda assim, se recusou a acreditar. Suzuki retornou ao Japão e relatou a situação ao governo, que localizou o ex-comandante de Onoda, o major Yoshimi Taniguchi, que havia se tornado um livreiro após a guerra.
A rendição
Taniguchi foi até Lubang, onde se encontrou pessoalmente com Hiroo Onoda e formalmente comunicou o fim da guerra ao ex-oficial, emitindo a ordem de depor armas. Ao longo dos quase 29 anos de guerrilha, o pequeno grupo havia matado cerca de 30 filipinos em vários ataques, mas Onoda ficou livre ao se entregar as autoridades, vez que recebeu o perdão do presidente filipino Ferdinand Marcos.
Hiroo Onoda se rende ao presidente filipino em 1974. Em sua rendição, entregou sua espada, cerca de 500 cartuchos de munição e várias granadas de mão.
Em seu regresso à pátria, Onoda foi recebido por cerca de 4000 compatriotas no aeroporto e se tornou uma figura de muita popularidade no Japão. Lançou uma autobiografia intitulada No Surrender: My Thirty-Year War (“Os Trinta Anos de Minha Guerra”, título no Brasil).
Vida pós-guerrilha
Em abril de 1975, se mudou para o Brasil, onde exerceu atividade de fazendeiro na Colônia Jamic, comunidade japonesa de Terenos, no Mato Grosso do Sul, juntamente com seu irmão mais velho, Tadao. Casou-se em 1976 e assumiu um papel de liderança na colônia. Em 1984, Onoda retornou ao Japão, onde estabeleceu o Onoda Shizen Juku, um acampamento educacional para jovens que é realizado em vários locais no Japão.
Onoda foi condecorado com a medalha de Mérito Santos-Dumont pela Força Aérea Brasileira em 6 de dezembro de 2004. Em 21 de fevereiro de 2010, a Assembleia Legislativa do Mato Grosso do Sul lhe concedeu o título de “Cidadão do Mato Grosso do Sul”. Hiroo Onoda visitava o Brasil regularmente até falecer aos 91 anos em Tóquio no dia 17 de janeiro de 2014.